domingo, 22 de setembro de 2013

Sob esse sol

sob esse sol
hipnotizados pelo horizonte sugerindo o infinito
nos sentimos heróicos
invulneráveis
benditos 
intensos

sob esse sol
nossos sorrisos de asas abertas
povoam um céu de azul profundo
imenso

sob esse sol 
as manhãs nos surpreendem nadando num oceano de calma
paz
prazer
e cor

mas como vai ser
quando esse sol se for?

domingo, 8 de setembro de 2013

Lirismo Noctívago 2 (Variação)

1.

            Sob a noite paulistana, quatro jovens num carro. Talvez fosse a primeira vez que o motorista com seus não mais de 18 anos punha os amigos no carro e saía sem a companhia dos pais.
            No banco de trás, uma de suas amigas riu quando viu a prostituta na rua. O menino ao seu lado sorriu, constrangido (mas secretamente encantado pela pele exposta da prostituta).
            Dentro do carro, todos riam, maravilhados com as luzes, os semáforos, o escuro acolhedor e cúmplice agarrado ao asfalto, impregnando a paisagem. 
             Eles observavam e comentavam a noite - 
            acesos, encantados, entusiasmados, eufóricos, 
            com o gosto de liberdade  transbordando pelos olhos, 
            enchendo
                         a boca de saliva
(e a vida mais viva deles
                                      me lembrou
                                               meus
                                               16).


2.

            Estávamos em uma loja de camisetas na Augusta, escolhendo presentes. Ela percebeu que eu não queria estar ali e perguntou se eu não queria esperar num bar.
            Fui. Pedi uma água, acendi um cigarro e me sentei numa mesa na calçada, vendo os que passavam.
            Primeiro vi Peter Pan - a lésbica de chapéu com pena, camisa xadrez e botas - e sua amiga. Subiam a rua conversando sorridentes - com seus rostos angelicais, andróginos, lisos e peles de pêssego que magnetizavam a luz dos postes.
            Depois vi o bêbado com a garrafa de Presidente, tropeçando no vento, falando sozinho e olhando maravilhado para o carrinho de bebê passeando ao seu lado (tão encantado que quase tropeçou nos sacos pretos de lixo cochilando nos pés do poste).
            Por um momento não tive muito com o que me distrair - até que vi na outra calçada duas adolescentes lésbicas abraçadas e orgulhosas de seu amor na noite quente, confortável e receptiva da Augusta. Quando atravessavam a rua, marmanjos roqueiros secando latas de cerveja barata riram dos beijos e abraços delas (mas sem conseguirem disfarçar sua vontade de fazer parte daquilo).
            E continuei ali até o cigarro e a água acabarem e sob a luz dos postes voltei pra loja.
            Ali, uma menina que falava inglês e seu namorado estrangeiro se encantavam com as estampas descoladas das camisetas e a atendente pequena, cheia de tatuagens e maquiagem, gastava seu inglês (que dizia ter aprendido com letras de música) tentando descrever as belezas do Brasil

enquanto lá fora
a noite s/ lua
                        louca
            e ansiosa
                                    ainda suspirava
                                    pelos lábios
                                    do sol.

domingo, 1 de setembro de 2013

Momentos de porcelana

Para Écia


1.

se insinua        me inspira
se continua      me revira

sua unha
minha língua
minha              pele na            sua transpira
sua

até que pouco a pouco
o agora se torna
desejo
hipótese
carne crua



2.
"Me fiz em mil pedaços pra você juntar"
Renato Russo, "Quase sem querer"

me desfaço
nos seus braços
nos seus traços
nos atalhos que alongam o caminho
nos retalhos que forram o chão deste céu
e nunca me deixam sozinho

só me refaço quando              nos seus lábios
na sua carne
nos laços que amarram o espaço que ocupo em você
no compasso da música que embala o teu prazer
em qualquer momento em que eu seja um pedido de você

pra de novo me desfazer
e me desfaço

e desta vez quando me refaço
o pouco que quero
é ser destino
pros teus passos

Ilustração: Diogo César, "Staring Lady"