quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Nem parece mais motivo pra lamento

no assoalho
assistindo ao nascer do sol
se espalhando pelo espelho
(insistindo em se espalhar
por tudo que vemos)

na boca nos beijos
no perfume dos teus cabelos

nos coqueiros araucárias
ipês amarelos
carnaúbas
nas matas oprimidas pelo cimento

nas palhoças
nas casas de pau a pique
nas paredes de madeira dos barracos
na sacada dos apartamentos da Paulista

(ocupando completamente o pensamento)

nas Cataratas do Iguaçu
ofuscando todo o brilho do Cruzeiro do Sul
no Corcovado no Cristo Redentor

(já não adianta ponto nem remendo)

misturado às águas do Paraná
cobrindo a superfície do São Francisco

(um cheiro típico na garupa do vento)

ganhando noites e dias
carnavais e folias
chuvas de verão e enchentes

nos bastidores
nos palcos atrás das cortinas
diante das lentes

onde a polícia vê
mas a investigação não diz
a cor que falta
na bandeira do país

do Oiapoque ao Chuí
do extremo norte ao sul
onde antes suspirava um céu azul

“Nos teus bosques têm feridas
Nossa vida, no teu seio, mais dores”
ecoando em milhares de depoimentos

(nem parece mais motivo pra lamento)

em todo lugar
a todo momento
sangue
sangue
sangue
(escorrendo)

domingo, 12 de janeiro de 2014

Sua vinda

Sua vinda foi anunciada em esmeralda, ouro, céu azul e nuvens brancas.

Décadas de um desejo, promessa, Paraíso,
alívio para o peso do chumbo,
o fim do império do silêncio e do medo.

Esperamos que viesse altiva, de cabeça erguida,
mas te cumprimentamos encarquilhada, sem fala.

Esperamos que viesse em roupas de gala,
mas veio calçada em saltos decadentes, vestida em farrapos

e trouxe a visão de folhas amarelas
caindo em plena primavera

e a sensação de que essa
continua sendo uma terra
em que o sol não toca -

onde Ordem e Progresso
parecem ser só pintura de rua
em ano de Copa.