duas
adolescentes
magras
barriga
de fora
atravessam
a avenida
suas coxas e umbigos inspiram
buzinas
e apressadas
alcançam
a calçada
a
tarde termina com as filas de carros
as
bicicletas e os que voltam do trabalho
cachorros
esparramados pelo meio-fio
balançando
as orelhas ao som dos
motores - seus olhos flutuando calmamente
ao
ritmo dos carros e dos motoristas
de
almas mutiladas
contrariando
a velocidade destes tempos
a noite
c
a
i
l
e
n
t
a
m
e n t e
a
lua vela
o sol
morrendo de frio
a
poeira rasteja de encontro ao vento
a
noite
apresenta patas pegajosas
se
derrama gelada pelo para-brisa
semeando tragédias delicadas
ao
longo da avenida
os
rostos miram o asfalto fosco e triste
pelo
açougue desativado
os
casais adolescentes
compartilham
seus cigarros
garrafas
de vinho
lábios e genitais
(pela
calçada
seus
cadarços desenham as partituras da música mais elétrica que a noite já tocou)
círculos
de pedra lâminas lágrimas
em
silêncio tenso
enquanto
a noite
devora as
luzes
e lambe as lágrimas dos postes
dois
gays
conversam
no portão
de
uma casa
espantalhos
maquiados oferecem felação em esquinas decoradas para o Natal
duas
lésbicas voltam juntas para casa
carregando
sobre os ombros
o escuro
da noite
e o peso dos próprios
lábios
a
noite umedece as paredes
até
a madrugada escorrer pelas calhas
se
esparramar nos parapeitos
e
arder nas pupilas
(tatuando
pequenos lamentos na palma da mão)
Ilustração: Diogo César, Crying Songs and Tears