Já nadei contra a corrente. Hoje corro na contramão. Mas
não me aponte como mais um entre tantos – sou menos um entre poucos.
Cortei o cabelo. Troquei de roupa. Apaguei o cigarro.
Esvaziei a pia e as garrafas e convidei meus amigos pro lanche da tarde. Vou
comemorar meu aniversário num tapete de lágrimas infantis. Pedi que trouxessem
misericórdia.
(o espelho foi quebrado por não
refletir o que queriam ver
o moleque mimado de olhar
vidrado virou outro imbecil no quadro de empregados
o sobrevivente das trincheiras
verbais desertou
e agora vende mapas nos
semáforos
a estação das flores virou Uma
Outra Estação –
Uma Estação no Inferno)
motor(es)
trabalhanDOininterruptamENTE
celular(es)
tOCANDOincessantemente
silêncio raro
CÂMERAS CÂMERAS CÂMERAS CÂMERAS
CÂMERAS CÂMERAS
CARAS e bOCAS CARAS e bOCAS
CARAS e bOCAS CARAS e bOCAS
OlhOs de néOn OlhOs de néOn OlhOs de néOn OlhOs de néOn OlhOs de néOn
falta de expressão falta de expressão
falta de expressão falta de expressão
palavras vazias de objetivo
vaidade gratuita caridade paga
vidas
públicas PROPRIEDADEs PRIVADAs
nome
e FAMA fome de FAMA
olhos
atentos às tendências da MODA
ouvidos
atentos aos assuntos da roda
espelhos
e
GENTE
se arrumando
diante deles
GENTE
vociferando virtudes
dicas
pra uma VIDA SAUDÁVEL
produtos
anunciados por publicitários milagreiros
anarquia
X repressão
EUforia
e dePRESSÃO
revolucionários
transformados em temas de calendário
hinos
libertários tocados em comerciais de carros
sinais
de rebelião reduzidos a estrofe refrão e rimas com “ão”
diga
adeus à revolução
e
pegue seu prato de sopa
no
fim do corredor da morte
amor
livre virou site pornográfico
PAZ
E AMOR
estampadas
em camisetas de grife
banalizaram
os extremos
andamos
em círculos
perdemos
os remos
o
sentido da vida reduzido a 15 minutos de fama
a
luz dos holofotes ofusca
não
permite ver
o
que há além
sombras(?)
escombros
(?)
tempos
caprichosos
vaidosos
exibidos
petulantes
sem limites
cheios de expectativas
sob a chuva
de palpites
estamos
a salvo da fúria das estrelas e dos delírios da lua
mas
as nuvens ainda espreitam nossos delitos
há
uma
filial
do
paraíso em cada esquina
divulgada
em panfletos distribuídos nos semáforos
sugerida
em cenas
de
novela
profetas
tecnológicos
analisam
ameaças
que
nossos corações já enfrentam
ninguém
pode parar a chuva
calar
a luz do sol
imprimir
a
textura
das
árvores
nos
relâmpagos
do tempo
os ponteiros
correm
o relógio dá
voltas e mais voltas
o mundo
acorda e dorme
o sol nasce
e traz de volta seu brilho
e a gente
continua aqui -
sem
respostas sem
nunca saber
por que
fazemos
isto ou
aquilo
só tentando
preencher
nosso
vazio
perdemos
a viagem
mas
viemos pra ficar
durante
a noite
com
medo das feridas se abrirem
não
fechamos os olhos
mas
não tema
não trema
vou
contigo
céu afora
vem
comigo
noite
adentro
Deus
espero
esperança
estenda
Sua mão seja
feita
uma nova Aliança
Cristo
não
desisto
da
sabedoria desesperada
dos
anjos
vou
manter minha bíblia fechada até o próximo Carnaval e
sentado
na minha cama
esperar
que a Revelação me apanhe
em flagrante
delito